'Até Onde a Vista Alcança' apresenta luta Kariri-Xocó em debate no Festival de Gramado

Diretores Alice Villela e Hidalgo Romero exibem o filme ao lado de representantes indígenas; música, retomada territorial e espiritualidade pautam a conversa

Debate do documentário Até Onde a Vista Alcança, que concorre ao prêmio do 53º Festival de Cinema de Gramado - Crédito: Ticiane da Silva / Ag Pressphoto


Na manhã deste sábado, 23, a Sociedade Recreio Gramadense recebeu a coletiva de imprensa de 'Até Onde a Vista Alcança', documentário de Alice Villela e Hidalgo Romero, que acompanha a luta e o planejamento de uma nova retomada territorial do povo Kariri-Xocó. A conversa, mediada por
Roger Lerina, teve a participação da equipe de produção e das lideranças indígenas Kayane Nunes e Pawana Crody.

Gravado principalmente em Campinas (SP), sede da produtora Laboratório Cisco, o longa conecta terra, política e espiritualidade para registrar um momento decisivo de organização e resistência do povo Kariri-Xocó. A obra estreou no 53º Festival de Cinema de Gramado, onde concorre aos prêmios desta noite.

"Nosso canto é uma forma de expressão"

Um dos eixos abordados na coletiva foi a música. Pawana observou que, embora pouco verbalizada, a trilha sonora e os cantos têm presença marcante na narrativa. Kayane Nunes, que aparece no documentário, destacou a potência afetiva e espiritual do som: "Tem uma cena no filme que meu irmão me pergunta o que a música representa pra mim, e eu falo que é um sentimento, porque ela me dá a calma que o mundo me tira. A gente já nasce na luta e, quando a gente fala de luta, já imagina um caos. Só que nosso canto é uma forma de expressão".

Durante a coletiva, Pawana foi questionado se conhecia os povos Kaingang, do Rio Grande do Sul. Ao iniciar a resposta, ele disse "Ynatekié", explicando que a palavra significa gratidão pela pergunta, já que "obrigada" é um termo colonial e "não somos obrigados a nada". 

Na sequência, ressaltou a presença de povos originários na região Sul e diferenciou as noções de extermínio e ocultamento como marcas históricas da violência colonial. Segundo ele, muitas práticas e saberes precisaram ser preservados no silêncio para garantir a sobrevivência cultural dos povos indígenas. "Eu falo português porque fui obrigado a falar português, que não é a nossa língua. Nossa língua é o tupi-guarani, yate, a língua materna dos nossos antepassados", afirmou, acrescentando que, hoje, há mais liberdade para as práticas sagradas, ainda que a trajetória de repressão, inclusive a cantos e danças, não deva ser esquecida.

Ao apresentarem o projeto, Alice Villela e Hidalgo Romero sublinharam que o filme busca descolonizar o olhar, entregando a condução da narrativa às vozes Kariri-Xocó e acompanhando assembleias, rituais e estratégias comunitárias ligadas à retomada territorial. A equipe também chamou atenção para a importância dos editais públicos que viabilizam documentários com este recorte e alcance.


A equipe de Coletiva.net acompanha o 53º Festival de Cinema de Gramado, realizado de 13 a 23 de agosto, na Serra Gaúcha. Nesta edição, o apoio é da Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), que enviou estudantes de Jornalismo e Publicidade e Propaganda para reforçar a cobertura. O público pode conferir matérias e entrevistas exclusivas sobre o evento no portal, repercutidas nas redes sociais - Facebook e Instagram -, além de drops em Coletiva.rádio.

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