Quem é o dono da resposta? A disputa pela autoria no universo da IA

Com o avanço das Inteligências Artificiais Generativas, fica clara a ausência de uma regulamentação eficaz no Brasil

05/09/2025 14:00
Quem é o dono da resposta? A disputa pela autoria no universo da IA

Yasmine Mabel é advogada associada do Silva Lopes Advogados, mestranda em Propriedade Intelectual e transferência de tecnologia para Inovação no IFRS e certificada em Propriedade Intelectual pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual (WIPO). Nessa entrevista, ela explica as diferenças entre conceitos jurídicos importantes e comenta os impactos da Inteligência Artificial Generativa na legislação atual e futura. 

 Como a legislação se aplica nos casos em que a Inteligência Artificial Generativa absorve criações humanas para gerar conteúdo próprio?

A propriedade intelectual é um conjunto de normas que regulamenta as criações. Dentro dela, temos a propriedade industrial e o direito autoral ? que é onde essa questão se encontra. O direito do autor se refere a criações que vêm do espírito e, uma vez materializadas, elas independem de registro para serem protegidas.

Ainda não temos, em termos de legislação, algo que verse sobre as criações e os limites do uso da Inteligência Artificial. Mas aqui no Brasil, já surgem Projetos de Lei que trazem alguns pontos sobre isso.

Conheça alguns desses projetos:

 

 Quais são os principais pontos de conflito hoje no uso da IA Generativa?

O direito autoral garante outros tipos de direitos, como morais e patrimoniais. Os patrimoniais podem ser licenciados e terceiros podem explorar economicamente uma criação, que é o caso de uma exposição em uma galeria, por exemplo. Mesmo assim, os direitos do autor não podem ser transferidos. Então existe essa proteção.

A Inteligência Artificial gera conteúdos novos ? não plágios. Durante a trend das imagens do estúdio Ghibli surgiram dúvidas sobre cópia e pirataria. Só que o estilo não é protegido por direito autoral, senão a arte estaria limitada a cada autor.

A questão que fica é que a Inteligência Artificial conhece esses estilos, pois ela recebe um treinamento. Isso é feito por um mecanismo de coleta que quebra os dados de uma base para gerar um conteúdo novo, sem a possibilidade de comprovar de onde ele foi extraído.

 Mas existindo como comprovar que um conteúdo foi utilizado pela IA sem autorização, teríamos um amparo legal? 

Eu acredito que ajudaria se a Inteligência Artificial apresentasse as fontes utilizadas na criação de um conteúdo. Nós temos amparo na Lei do Direito Autoral, mas o problema fica em como demonstrar que a IA utilizou determinado conteúdo.

Conseguindo comprovar, ainda precisamos definir como calcular uma indenização. Isso requer medir o impacto que o resumo gerado pela IA do Google causou nos materiais dos quais se alimentou.

 E esses conteúdos gerados por IA podem ser considerados obras protegidas por direito autoral?

A lei brasileira diz que é protegida por direito autoral toda produção advinda do espírito humano. Então, o que for criado pela Inteligência Artificial não é protegido. No entanto, há alguns pormenores, como quando um humano tem atuação ativa para o resultado daquela IA. Ou seja, os comandos são tão detalhados e a descrição é feita de forma tão rica que gera, efetivamente, algo novo.

 O que você projeta para o futuro da regulação das IAs generativas no Brasil?

Acredito que teremos legislações com um viés maior de proteção, mas que, ao mesmo tempo, podem trazer limitações ao desenvolvimento. Grandes potências, como os Estados Unidos, estão cada vez mais incentivando o uso de Inteligência Artificial. Então temos que cuidar para que o Brasil não fique para trás.

Não temos a dimensão total dos impactos da Inteligência Artificial, pois não imaginávamos que ela iria se desenvolver tão rápido. Não sabemos para qual caminho vamos andar, então podemos acabar trazendo regras que não serão viáveis. Acho interessante trazer as disposições sobre IA para dentro de leis que já existem, como a própria Lei de Direitos Autorais.