Taís Seibt: Acima de tudo, feliz

Jornalista, professora e pesquisadora, ela é especialista em checagem de fatos

Crédito: Arquivo Pessoal

Que a vida do jornalista é uma caixinha de surpresas, não há discussão. Não importa em qual lado do balcão se esteja, ser jornalista é aceitar e abraçar uma trajetória incerta, mas muito dinâmica. É por isso que se há 10 anos alguém tivesse indagado Taís Seibt sobre onde ela estaria hoje, a resposta provavelmente envolveria a continuidade da rotina na Zero Hora, em meio à adrenalina dos plantões característicos da redação de um veículo tradicional. No entanto, não foi isso que aconteceu.

Fundadora da iniciativa Afonte Jornalismo de Dados, Tais hoje é diretora de Operações na agência Fiquem Sabendo - especializada na Lei de Acesso à Informação (LAI). Toda essa experiência também é levada para sala de aula como professora do Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) e da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos). Para fechar a rotina, a profissional também ministra cursos de curta duração sobre Jornalismo de Dados e checagem de fatos na Cásper Líbero. "Estou sempre pipocando no acadêmico e no jornalismo, mas, se alguém pergunta a minha profissão, digo que sou jornalista", defende. 

De Gramado para o mundo

Nascida em Gramado, em 1º de outubro de 1986, Taís é filha dos aposentados Pedro e Maria. Na zona rural e longe do glamour turístico da cidade, o pai - marceneiro - e a mãe - que trabalhou em malharias - proporcionaram uma infância humilde para as três filhas, mas com muito foco na educação. Uma das principais memórias de quando era criança é o ritual de ler jornal pela manhã. "Meu pai ficava bravo quando não entregavam a edição, porque aquela leitura era necessária, então sempre tive o entendimento de que o jornal era uma coisa importante", explica.

Como filha mais nova, a jornalista também contou com as irmãs Daniela e Betina na sua formação. Com brincadeiras que simulavam uma escola e acompanhando de perto os estudos das duas, Taís aprendeu a ler antes de pisar na sala de aula. "Tendo todo esse contexto, quando decidi que ia fazer vestibular, não tinha dúvida de que queria ser jornalista", conta. Além da educação, o esporte também teve seu lugar na trajetória dela, que começou a jogar vôlei aos 10 anos de idade no time da escola, prática que teve que interromper aos 30 anos por falta de agenda, mas não antes de conquistar alguns troféus. Hoje é apenas espectadora no vôlei, mas se dedica a aprender beach tennis e também não deixa de lado a torcida pelo Grêmio - uma herança de família.

Com raízes católicas, foi aprendendo a tocar violão na igreja que nasceu outro grande interesse: a música. Taís, que se define como "do rock", ainda toca o instrumento quando está entre amigos. "Todos os clássicos do rock me agradam e valorizo muito as roqueiras como Alanis Morissette, Pitty e Rita Lee", conta. No audiovisual, o gosto é mais popular, pois além de séries e filmes, assiste muitas novelas. "É um conteúdo que não precisa pensar muito e eu já penso bastante no meu dia", explica. Por sua vez, na Literatura, quando não está lendo algum texto acadêmico, a preferência é por histórias baseadas em fatos: "Romances ou fantasia não me chamam tanta atenção".

Para conseguir dar conta de todos esses interesses pessoais enquanto mantém uma vida profissional atarefada, ela segue uma receita simples: "Eu trabalho sério, mas também folgo sério". Os finais de semana são sagrados e é esse tempo que ela dedica para fazer o que gosta e estar ao lado dos amigos, da família e do marido, o também jornalista João Henrique. Os dois se conheceram na Expointer de 2017, quando a profissional fez um freelance para o Canal Rural. O companheiro, apesar de gaúcho, morava em São Paulo, destino que coincidiu com algumas viagens feitas por Taís devido ao doutorado. Entre idas e vindas, o casal finalmente se estabeleceu em Porto Alegre, onde moram juntos há seis anos e meio.

Descendo a serra

A graduação e a carreira de Taís começaram juntas, em 2004. Estava no primeiro semestre de Jornalismo na Unisinos quando conseguiu a oportunidade de trabalhar ao lado de Rozangela Alves, correspondente do Correio do Povo em Gramado e dona de uma assessoria de imprensa. "Então eu via toda a rotina dela, além de acompanhar em eventos e nas empresas que ela assessorava", comenta. Como estagiária, ainda passou pela assessoria de imprensa do Festival de Turismo de Gramado e do Hotel Serrano, antes de entrar para a equipe do Gramado Site. "Foi onde comecei a exercitar a redação mesmo, pois era um site jornalístico que cobria a cidade, com um foco bastante turístico", conta.

No entanto, apesar de parecer que a carreira e a formação iam a todo vapor, Taís quase desistiu do Jornalismo. Por ser a responsável por custear sua permanência na universidade, em 2008, a angústia de não ter conseguido fazer tantas cadeiras quanto gostaria se tornou o medo de não conseguir se formar. Dependendo de uma relação de trabalho para poder avançar, sua última cartada foi mandar currículos para empresas de Porto Alegre e conseguir se estabelecer na Região Metropolitana. Desse movimento, a oportunidade surgiu na extinta Vox Press, na Capital.

Em paralelo a isso, foi aceita como blogueira em uma plataforma da Zero Hora que levava os cadernos de bairro para o on-line através do olhar dos moradores. Ao escrever sobre o Moinhos de Vento, em uma época que o termo 'viralizar' ainda não existia, a jornalista chamou a atenção com uma história inusitada. "Na frente do shopping Moinhos, tinha um restaurante japonês onde havia sempre uma bicicleta amarrada. Então fiz uma crônica chamada: 'Alguém conhece o dono da bicicleta vermelha?'", conta. O texto gerou tanta repercussão que, além de encontrarem o proprietário, o assunto foi abordado na carta do editor, assinada por Marcelo Rech. "Isso me marcou muito na vinda para Porto Alegre e ali eu acreditei que poderia trabalhar na Zero Hora", conta.

O mundo lá dentro

Após isso, o trabalho no jornal não demorou a chegar. Com o período de estágio na Vox chegando ao fim, Taís passou em uma seleção para o Ministério Público (MP). Ela conseguiu conciliar o período de férias do órgão com um freelance na central de inverno do Grupo RBS em Gramado. "A partir disso, consegui entrar em um processo seletivo da Zero Hora e acabei deixando o MP", explica. Após um ano como estagiária, foi efetivada ao pegar o diploma em 2011, dando início a uma trajetória de quatro anos no lugar em que mais havia almejado até então.

Inicialmente, colaborou com a central do interior da Zero Hora, conectando os correspondentes com a redação. "Recebia o material dos repórteres e, dependendo do caso, apoiava na apuração aqui de Porto Alegre. Mas minha função principal era usar esse conteúdo no Click RBS", conta. Passou ainda pela editoria de Geral e pelo caderno Bem-Estar, além de integrar as equipes das eleições de 2012 e 2014, do incêndio da Boate Kiss e da Copa do Mundo de 2014. "Chegou um momento em que passei a ser folguista de todo mundo, pois tinha muita versatilidade. Cobri folga dos editores de capa e contracapa, fiz plantão de madrugada e até cheguei a editar no Esporte", enumera.

Para Taís, o período na Zero Hora foi de crescimento, inclusive por ter presenciado grandes viradas do veículo: "Minha dissertação de mestrado foi sobre a integração do jornal impresso com o on-line". Contudo, a hora de se despedir do Grupo RBS chegou junto com o doutorado, em 2015, ao conquistar uma bolsa na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs). "Eu também sentia falta de saber qual era meu espaço na redação, pois não tinha um paradeiro fixo", admite. Segundo a jornalista, o doutorado também foi uma oportunidade de "sair e olhar o mundo".

E o mundo lá fora

Foram quatro anos de dedicação à pesquisa e muito comprometimento em, de fato, explorar o "mundo lá fora". "Me propus a olhar o que estava acontecendo de novo, e, ao fazer o mapeamento de novas iniciativas, o fact-checking chamou minha atenção", pontua. Em uma época onde era "tudo mato", Taís foi pioneira em abordar o assunto até entre os colegas. "Quando falava que estava pesquisando isso, outros jornalistas não entendiam o que havia de diferente na checagem de fatos, pois achavam que era algo que o Jornalismo já fazia", explica.

Hoje, ela avalia a trajetória que escolheu como um acerto. "Meu objeto específico foi a cobertura das eleições de 2018, que foi quando o jogo inverteu. Muita gente começou a me procurar para entender mais sobre o assunto", revela. Mesmo antes de concluir o doutorado, Taís se viu posicionada em um debate onde poucos tinham entendimento até então. Para a jornalista, que passou a ministrar palestras e cursos e participar de congressos, foi uma ótima oportunidade acadêmica, pois, em paralelo, estava construindo e tentando entender o que faria após concluir a pesquisa.

Com a visibilidade, acabou angariando contatos no resto do Brasil, assinando trabalhos para Agência Pública, BBC Brasil, O Estado de S. Paulo, O Globo e The Intercept. Em 2019, também passou a levar toda a bagagem para a sala de aula da Unisinos e, um ano mais tarde, entrou para a equipe da Fiquem Sabendo. O trabalho, inicialmente temporário, acabou se estendendo devido a pandemia. Na agência, participou da concepção do projeto que considera seu "xodó", o WikiLAI, um guia com informações sobre o acesso a dados públicos no Brasil. Hoje, apesar de estar na direção de Operações, Taís revela que a organização interna está sendo reestruturada, movimento que a levará para a direção de Estratégia da agência.

Em retrospecto, a jornalista afirma que nunca imaginou que sua carreira seguiria esse caminho. "Falo para os alunos que ninguém vai para o Jornalismo porque gosta de planilha e estatística. Mas me apaixonei pela área, fiz coisas importantes, ganhei prêmios e contribui com projetos relevantes", comenta. Olhando para frente, Taís conta que gostaria de ter alguma experiência internacional e publicar um livro relacionado à própria tese de doutorado.

Contudo, independentemente daquilo que está fazendo, ela considera que o comprometimento é essencial. "Se eu vou conversar contigo, que seja uma conversa boa, se eu vou dar aula, que seja boa, se eu vou fazer um relatório, que seja um bom relatório", exemplifica. Por isso, enquanto os planos ainda não se concretizam, ela avalia que cumpriu bem todas as missões que teve, sempre com disposição e alto astral: "Eu, acima de tudo, sou feliz".

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