Ódio Olímpico e superação

Por Flávio Dutra

Fim do grande evento esportivo e chego à conclusão que nem tudo é  espírito olímpico nos Jogos Olímpicos. Claro que tem muito do legado do Barão de Coubertin - " o importante é competir" - ,  vibração e amabilidades com seus iguais em alguns esportes como no skate e  entre as ginastas, mas juro que ouvi pelo menos duas vezes menção ao "ódio" por competidores brasileiros.  Nos dois casos entendi que o sentimento era resultado de frustrações em disputas anteriores, como Virna, do vôlei, que estava engasgada com a derrota para as polonesas na Liga das Nações, e como a judoca Rafaela Silva, que havia sido eliminada por uma japonesa na luta pelo bronze.

O ódio é uma poderosa energia, que rompe barreiras e impulsiona em direção ao objetivo a ser atingido, afirmam os especialistas. Tanto para o vôlei como para o judô brasileiros a odiosidade funcionou na recuperação da autoestima abalada: o odiento time de Virna venceu a Polônia por 3 x 0, enquanto a Rafaela e suas companheiras, com muita gana,  conquistaram a medalha de bronze por equipe. 

Acredito mais nos sentimentos expressos por Virna e Rafaela do que nos agrados a atletas adversários. Até porque o objetivo maior de todos os atletas é subir no podium e isso é mais provável de ser atingido com o combustível que vem do ódio e não com confraternizações entre concorrentes. Além da medalha, há muitos interesses em jogo para os olímpicos, como premiações por ouro, prata e bronze,  contratos de patrocínio,  convites para comerciais, mais apoio na preparação,  ascensão social, mas acima de tudo o desafio da superação.

Ainda me emociono quando um brasileiro sobe ao pódio e exibe orgulhoso sua medalha.  São tão poucas em comparação com as grandes potências olímpicas e tão marcadas pela superação as parcas conquistas dos nossos atletas que os elegi como meus heróis, aqueles por quem vale a pena  torcer e se emocionar. Por isso, rejeito com todas as minhas forças a cobrança como fracasso, quando uma expectativa de medalha não se confirma, como no caso do Hugo Calderano no tênis de mesa ou do nadador Guilherme Costa, o Cachorrão, ou o "apenas" bronze ao invés do ouro no caso do Gabriel Medina, no surfe. Foi assim também com a nossa Daiane dos Santos, que amargou um quinto lugar em Atenas, quando o ouro era tido como certo por todos os brasileiros. 

Não posso deixar de ser solidário e me comover com o jovem que chora por ter decepcionado uma nação que esperava dele,  naquele rápido século de duração  das provas, a redenção para suas frustrações cotidianas. Ingrata nação, injusta nação.  Os deuses olímpicos não estão nem aí para as nossas expectativas e preferem ajudar quem se ajuda, quem investe com seriedade em políticas públicas para fomentar o esporte e  que busca através das práticas, de alto rendimento ou apenas recreativas, uma nação mais saudável e não uma forma de propaganda para proveito político.

Autor
Flávio Dutra, porto-alegrense desde 1950, é formado em Comunicação Social pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), com especialização em Jornalismo Empresarial e Comunicação Digital. Em mais de 40 anos de carreira, atuou nos principais jornais e veículos eletrônicos do Rio Grande do Sul e em campanhas políticas. Coordenou coberturas jornalísticas nacionais e internacionais, especialmente na área esportiva, da qual participou por mais de 25 anos. Presidiu a Fundação Cultural Piratini (TVE e FM Cultura), foi secretário de Comunicação do Governo do Estado e da Prefeitura de Porto Alegre, superintendente de Comunicação e Cultura da Assembleia Legislativa do RS e assessor no Senado. Autor dos livros 'Crônicas da Mesa ao Lado', 'A Maldição de Eros e outras histórias', 'Quando eu Fiz 69' e 'Agora Já Posso Revelar', integrou a coletânea 'DezMiolados' e 'Todos Por Um' e foi coautor com Indaiá Dillenburg de 'Dueto - a dois é sempre melhor', de 'Confraria 1523 - uma história de parceria e bom humor' e de 'G.E.Tupi - sonhos de guri e outras histórias de Petrópolis'. E-mail para contato: [email protected]

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