O crime mostra sua ousadia

Por Renato Dornelles

16/09/2025 13:40 / Atualizado em 16/09/2025 13:42
O crime mostra sua ousadia

O crime, quando organizado, tem entre as suas características a ousadia. E esta foi demonstrada, ao que tudo indica, pela maior facção criminosa do país ao dar um recado sangrento com a execução do ex-delegado-geral da Polícia Civil de São Paulo (cargo equivalente à Chefia de Polícia no RS), no início da noite de segunda-feira, em Praia Grande, no Litoral paulista.

Ruy Ferraz Fontes, o ex-delegado, já há bastante tempo estava jurado de morte pelo Primeiro Comando da Capital(PCC) por, entre outras coisas, ter indiciado a cúpula da organização após o famoso "Salve Geral" de 2006, quando integrantes do grupo atacaram agentes da segurança pública, prédios públicos e ônibus nas ruas, em um evento que deixou mais de 100 mortos. O policial também foi importante no processo de transferência do líder Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, para o sistema prisional federal.

Recentemente, a Polícia Federal, a Receita Federal e órgãos como o Ministério Público de São Paulo (MPSP) realizaram uma mega-operação para desarticular ação do PCC no setor financeiro. O esquema criminoso utilizava fundos de investimentos e empresas financeiras que operam na avenida Faria Lima (principal centro financeiro de São Paulo) para gerar, lavar, ocultar e blindar recursos da atuação da facção no tráfico de drogas e no setor de combustíveis.

É mais uma prova da ousadia e do cada vez mais crescente nível de organização da facção que atua em quase todo o país e no Exterior. Em um dos episódios da série documental de TV "Retratos do Cárcere", (produção da Panda Filmes e coprodução da Falange Produções), o promotor de Justiça Lincoln Gakiya, já em 2018 definia o PCC como uma pré-máfia.

Em sua coluna no portal GZH, o experiente jornalista Humberto Trezzi lembrou que no México, em um status mais avançado, as organizações criminosas bancam eleições de prefeitos, governadores e chegam a influenciar a escolha de presidentes. Como ocorreu na Colômbia dos cartéis, tempos atrás. Ou seja: é o crime se infiltrando nos poderes constituídos em busca de vantagens.

Por aqui no Brasil, salvo algumas poucas exceções regionalizadas e ainda isoladas, o crime (seja o tráfico de drogas, sejam as milícias) ainda não atingiu tal nível. Mas vejo como sugestiva a ideia que vem sendo tentada no meio político de utilizar formas supostamente legais (o "supostamente" fica por conta das discussões em torno da constitucionalidade) para livrar condenados de cumprimento de pena.

Durante o seu mandato, o ex-presidente Jair Bolsonaro tentou, por meio de indulto presidencial, livrar o então deputado Daniel Silveira, seu amigo e correligionário, de uma condenação de oito anos e nove meses. Agora, correligionários e aliados do ex-presidente tentam livrá-lo de condenação por tentativa de golpe por meio de projeto de lei de anistia.

Ainda que não haja relação entre as ações no meio político e o crime organizado, não é de se duvidar que as tentativas de manobra estejam inspirando o crime organizado e motivando suas lideranças a investirem pesado nas próximas eleições, como forma de ter representantes e lobistas junto ao meio político, em busca de perdões judiciais.