IN FORMA

Por Marino Boeira

28/08/2024 13:57 / Atualizado em 28/08/2024 13:55
IN FORMA

MEMÓRIAS PERDIDAS

A cada ano que passa, dois entre os mais importantes acontecimentos da história do Brasil são menos lembrados: a morte de Getúlio Vargas em 1954 e o movimento da Legalidade liderado por Leonel Brizola em 1961.

Como estamos num ano eleitoral com a prevista eleição de um novo prefeito de Porto Alegre, candidatas do PDT e do PT/ PSOL, Juliana Brizola e Maria do Rosário estiveram na praça da Alfândega para lembrar Getúlio junto à sua carta testamento.

À candidata do PDT, como neta de Brizola, sobram razões para essa lembrança, mas à representante do PT/ PSOL o fato soou como um claro oportunismo político. A justificativa para o gesto foi a presença no ato de grupelho que tenta resgatar a imagem de um partido, o velho PTB, cuja memória Leonel Brizola buscou apagar quando rasgou publicamente em dezembro de 1981, um papel com as letras P, T e B, do seu Partido Trabalhista Brasileiro, cuja sigla o representante da ditadura, o general Golbery havia entregue à Ivete Vargas.

Caso não lembrem dessa imagem, talvez se recordem do que escreveu o nosso maior poeta, Carlos Drummond de Andrade, sobre o gesto de Brizola: ?Vi um homem chorar porque lhe negaram o direito de usar três letras do alfabeto para fins políticos. Vi uma mulher beber champanha porque lhe deram esse direito negado ao outro. Vi um homem rasgar o papel em que estavam escritas as três letras, que ele tanto amava. Como já vi amantes rasgarem retratos de suas amadas, na impossibilidade de rasgarem as próprias amadas?.

Até o dia 7 de setembro, quando João Goulart, em 1961, tomou posse em Brasília como Presidente da República, haverá tempo para lembrar o grande movimento que foi a Legalidade.

Muitos dirão que a posse de João Goulart, ainda que num regime parlamentarista, urdido num conchavo de velhas raposas políticas como Tancredo Neves e Ulysses Guimarães com os militares que poucos anos depois derrubariam o governo com o golpe de 64, foi uma prova do espírito conciliador do povo brasileiro.

Poucos dos atuais candidatos serão capazes de lembrar que a luta pela Legalidade em 1961 foi a última grande oportunidade que o Brasil teve de fazer finalmente a revolução social que permitiria a transformação numa grande potência mundial.

Quem viveu aqueles tempos ou se informou depois sobre eles, lendo nossos melhores historiadores, sabe que pela última vez no século passado e no atual, a correlação de forças era favorável aos movimentos populares que apoiavam à Legalidade.

Naqueles dias, no final de agosto e início de setembro de 1961 havia um povo que se armava através de sindicatos e organizações políticas e tinha ao seu lado o maior e mais forte contingente militar do País, o Terceiro Exército, a Brigada Militar e uma liderança política, Leonel Brizola, dispostos a pagar para ver.

Infelizmente a oportunidade foi perdida e logo as elites políticas que dominavam o País desde a Independência retomaram o controle da situação.

Certamente nenhum dos candidatos (as), mesmo as que se dizem de esquerda, como Juliana e Maria do Rosário, comungam dessa visão sobre os fatos passados. Obviamente Melo e Camozato também não.

Em vez disso os candidatos aproveitarão os seus espaços na mídia para falar de quem foi e quem não foi o responsável pelas enchentes de maio e de todos seus projetos requentados sobre como deverá ser a Porto Alegre do futuro.

Então, para o eleitor mais esclarecido política e historicamente será difícil optar por um dos nomes propostos e talvez o mais correto seria dizer um ?Não? para todos eles.