Fazer Jornalismo

Por Vieira da Cunha

No meu tempo... "No meu tempo" é uma expressão excludente e elitista, ao deixar de incluir na relembrança todos os seres que não viveram aquele tempo. Mas há exceções, e estas estão nos momentos em que invocar aqueles outros tempos ajuda a refletir sobre o que se passa hoje. E relembrar situações ou episódios passados ajuda a tentar evitar erros ou esforços desnecessários para inventar a roda.

 Hoje há uma distorção terrível nas relações imprensa-governantes em que estes, autoritariamente, convocam representantes daquela para conceder uma entrevista coletiva. Ora, entrevista coletiva geralmente é agendada por quem tem interesse em divulgar determinada mensagem; tão antiga quanto a própria instituição da imprensa, é um momento em que alguém, com conhecimento para tal, encontra-se com profissionais da mídia para revelar ou explicar fato determinado. Mas, ao contrário do que se tornou rotineiro nos dias que correm, não se trata de convocação e sim mero convite; não tem um governante, por maior que seja seu status de poder, autoridade para convocar jornalistas. Aqui se aplica muito bem a máxima popular que determina que cada um deve ficar no seu quadrado.

Um rodado repórter e entrevistador é Ricardo Kotscho, jornalista e escritor ganhador de prêmios e lauréis em uma carreira de cinco décadas. Fala com propriedade sobre jornalismo e política e recentemente, em uma conversa com colegas jornalistas, trouxe reflexões sobre redações, repórteres, editores e toda a cadeia de comando de uma empresa jornalística. Discorre especialmente sobre a cobertura da mídia nos episódios da Lava-Jato e da Vaza-Jato.

As lições deste longevo repórter estão à disposição de colegas de todas as idades a futuros jornalistas no canal Nova Coonline no YouTube, que merece ser visitado pelos que procuram acompanhar o momento da comunicação.

Kotscho é um belo exemplo de que jornalistas não são espécie em extinção, como se apregoa por aí, muito antes pelo contrário. O jornalismo está mudando sua forma de atuar, agora ancorada em ferramentas e tecnologias inexistentes "no meu tempo", mas o objetivo segue o mesmo, trazer à luz especialmente o que governos e empresas e entidades se dedicam a esconder. E isso vai desde o futebol, com o episódio do joelho do Suárez, ao desperdício do dinheiro público com a compra de equipamentos para a educação, como aconteceu na Prefeitura de Porto Alegre.

Governantes, políticos e líderes empresariais precisam ser permanentemente lembrados de que o jornalismo profissional e independente é que assegura a fortaleza da democracia e a saúde da sociedade. Parece óbvio, mas não custa lembrar sempre que possível.

Assim como não custa repetir a sapiência de Millôr Fernandes, para quem jornalismo é oposição, o resto é armazém de secos e molhados.

Autor
José Antonio Vieira da Cunha atuou e dirigiu os principais veículos de Comunicação do Estado, da extinta Folha da Manhã à Coletiva Comunicação e à agência Moove. Entre eles estão a RBS TV, o Coojornal e sua Cooperativa dos Jornalistas de Porto Alegre, da qual foi um dos fundadores e seu primeiro presidente, o Jornal do Povo, de Cachoeira do Sul, a Revista Amanhã e o Correio do Povo, onde foi editor e secretário de Redação. Ainda tem duas passagens importantes na área pública: foi secretário de Comunicação do governo do Estado (1987 a 1989) e presidente da TVE (1995 a 1999). Casado há 50 anos com Eliete Vieira da Cunha, é pai de Rodrigo e Bruno e tem quatro netos. E-mail para contato: [email protected]

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