A negação da enchente não está associada ao negacionismo político

Por Elis Radmann

 

As chuvas e enchentes que estão devastando o RS trazem consigo muito sofrimento e sentimentos negativos, especialmente para quem está sendo afetado diretamente. Vivemos um momento de preocupação, medo, frustação e pavor. Dizem que é um evento extremo, algo fora da curva, que faz as pessoas ficarem em estado de choque ou incrédulas. Durante a pandemia, as pessoas ouviram a máxima que, para se cuidar, deveriam ficar em casa. Agora é ao contrário, precisam sair de casa. Isso quando não são tirados às pressas ou ficam dias em cima de telhados, esperando socorro. 

Pela experiência do embate político da pandemia, há quem diga que a relutância de sair de casa está associada ao negacionismo. Este é um contexto distinto e a hesitação está associada a diferentes razões que precisamos entender para ter empatia com quem fica postergando a saída:

a) A identidade emocional com a casa, lugar sagrado de cada um. O único espaço de privacidade que se tem, o refúgio;

b) O receio de ficar socialmente exposto nos abrigos, especialmente, para famílias. Nos abrigos não há privacidade, há risco de violência física e muita violência verbal entre as pessoas, que estão muito estressadas e explodem por pouca coisa;

c) Receio de ser roubado. Muitas pessoas acreditam que é melhor ficar de plantão em uma parte da casa, para evitar saques. Esse comportamento é maior em pessoas que moram em sobrados ou edifícios;

d) Esperança de que a água baixe. Esta leitura está baseada na experiência de moradores que vivem há décadas na mesma região e avaliam que a água sempre chegou perto, mas nunca entrou em suas casas. Logo, acreditam que se a água entrar, sairá rapidamente;

e) Dificuldade de evacuação. As famílias têm composições complexas e diferentes visões de mundo, vivendo conflitos internos para decidirem a saída. Em outros casos, é difícil a mobilidade de pessoas idosas, deficientes, acamados, crianças e animais; 

f) Informações confusas ou desinformação. Neste momento, existem muitas Fake News circulando sobre o RS. Enquanto os órgãos oficiais alertam, aparecem postagens inverídicas que confundem a capacidade de decisão das pessoas mais indecisas.

Na dúvida, a melhor decisão é sempre a prevenção. É aceitar a ajuda e ajudar. Não há nada mais importante do que a segurança de nossos amigos e familiares. E como diz o dito, não podemos fazer tudo por todo mundo, mas todo mundo pode fazer um pouco por alguém.

Autor
Elis Radmann é cientista social e política. Fundou o IPO - Instituto Pesquisas de Opinião em 1996 e tem a ciência como vocação e formação. Socióloga (MTB 721), obteve o Bacharel em Ciências Sociais na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e tem especialização em Ciência Política pela mesma instituição. Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Elis é conselheira da Associação Brasileira de Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia (ASBPM) e Conselheira de Desburocratização e Empreendedorismo no Governo do Rio Grande do Sul. Coordenou a execução da pesquisa EPICOVID-19 no Estado. Tem coluna publicada semanalmente em vários portais de notícias e jornais do RS. E-mail para contato: [email protected]

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