A Maravilha do Perigo

Por Fernando Puhlmann

09/08/2024 10:30
A Maravilha do Perigo

?Eu invento tudo na minha pintura.

 E o que eu vi ou senti, eu estilizo?

Tarsila do Amaral

 

O amor não é linha reta. O amor não tem fórmula, pode ter gosto, cheiro e tato, mas não tem lógica. Quem não compreende isso afunda algumas vezes. Nem seres com uma sensibilidade maior que a média, conseguem prever o amor. Ele chega sorrateiro e pode partir de uma hora para outra. Ele não tem idade, endereço e muito menos nexo. Amor é a vida em seu estado puro, nasce, cresce, se reproduz e morre. Ou não. Com Tarsila não foi diferente. Entre tantas obras geniais, entre tantos aplausos e reconhecimentos, uma vida amorosa atribulada.

Isso é ruim? Não sei, qual a graça de uma vida linear? O amor te empurra, às vezes para frente, às vezes para baixo. Quanto da cor daquela tinta tinha tons de dor, quanto tinha de alegria e gozo?

Embora sua obra não retrate o amor convencional, isso não quer dizer que ele e suas crises não estivessem lá. Traições, dores, sorrisos, suspiros, tudo faz parte do grande teatro da vida.

Muitas vezes o mundo idealizado do amor eterno, da outra metade, nos prende em relações tóxicas, que vão nos corroendo a alma e amargando a boca, é nesse momento que a vida grita por coragem. Se ela teve essa coragem toda ou se o destino a empurrou por decisões necessárias não sabemos, isso não está nos livros, mas está na vida.

Quatro casamentos, quatro recomeços.

Algumas guerras não são travadas por opção, mas por necessidade de sobrevivência. A mulher que mudou a história da pintura moderna brasileira, que escreveu crônicas, que desbravou o mundo, que faliu, que foi perseguida pelo governo, não se dobrou a vida, não aceitou o médio, não se conteve no mais ou menos, ela exigiu o amor maior, o sentimento do êxtase, a paixão que muitas vezes cega, mas que na maioria das vezes alimenta o elã vital.

Tarsila não foi só a frente do seu tempo, ela foi a coragem, por que é isso que a vida exige, coragem. Somos aficionados na busca da felicidade, como se ela fosse um estado a ser conquistado e não nos damos conta que a felicidade é um conjunto de momentos. Ninguém pode ser prisioneiro de um sonho, senão ele vira pesadelo e nem percebemos.

Na música ? A Vida Quis Assim?, que trata da separação dolorida do Oswaldo Montenegro, ele usa um verso lindo: Que pena que a vida quis assim, você viver feliz longe de mim, a dor rindo da minha solidão. Por que a vida é isso, é aprendermos a controlar só o controlável. O amor não é controlável, o amor é orgânico, é fluido, é fogo.

Que tenhamos coragem para aprender a não desafiar o amor, apenas vivê-lo na sua plenitude e quando este acabar, que saibamos recomeçar e tentar de novo.

Sem amor a vida é cinza, com amor ela é altamente perigosa e maravilhosamente encantadora.