A grande farsa

Por Marino Boeira

29/05/2024 16:38
A grande farsa

As inundações no Rio Grande do Sul escancaram mais uma vez a profunda divisão de classes socias em que vivemos.

Enquanto milhares de pobres perderam o pouco que conseguiram juntar na vida e permanecem em abrigos precários à espera das migalhas prometidas pelo governo, os empresários, todos incluídos na classe dos ricos, que particularmente sempre viveram em áreas imunes às enchentes, já estão se organizando para cobrar do governo as benesses de sempre.

Está tudo nos meios de comunicação:  a Prefeitura de Porto Alegre não concluiu o cadastramento das 60 mil famílias que perderam suas casas e que são candidatas a receber 5 mil reais do Governo Federal e por isso elas continuam vivendo da solidariedade de parentes e amigos. Enquanto isso, o vice-presidente Alckmin anuncia que o Governo Federal vai destinar 15 bilhões de reais em empréstimos para que os empresários retomem seus negócios.

Ou seja, quem nunca dividiu os lucros com os mais pobres, vai socializar os prejuízos com eles.

As trágicas enchentes do Estado permitiram mais uma vez um show de hipocrisia da mídia, dos políticos e mostrou a ingenuidade bem intencionada da maioria das pessoas.

A Rede Globo mandou sua estrela maior do jornalismo, William Bonner, para inundar os espectadores com um jorro ininterrupto de obviedades sobre o espírito solidário dos gaúchos, os gestos de desprendimento de alguns e o esforço de todos em recuperar o que se perdeu.

Não faltaram os closes nos olhares lânguidos de cães abandonados. Não faltou sequer a transformação de um cavalo, o Caramelo, num símbolo da resiliência dos gaúchos. A mulher do presidente, a Janja da Silva, carregou num avião da FAB para Brasília uma cadela, chamada midiaticamente de Esperança, simbolizando toda sua compaixão pelos animais.

Para os seres humanos, as atenções não foram tantas, mas afinal, eles podem se defender por conta própria e os animais não.

Nas redes socias, cães e gatos viraram estrelas. Arrumar um lar para eles se transformou numa corrente de solidariedade.

À margem desses grandes gestos filantrópicos, os políticos não perderam tempo. Afinal, em outubro já tem eleição para prefeito e as enchentes vão ajudar a marcar espaço. Quem fez o quê e quem foi mais ou menos responsável pelos trágicos eventos?

O prefeito Melo, merecidamente, e o governador Leite, um pouco, menos, são os grandes vilões na mídia e nas redes sociais. Como a eleição para a prefeitura é a próxima, as forças ditas de esquerda, há muito distantes da cadeira de prefeito de Porto Alegre, partiram para o ataque. A nota de crítica a Melo assinada por ex-prefeitos, três do PT (Olívio, Tarso e Pont), um do PDT (Collares) e Fortunati (PTB -?) é mais um passo para favorecer à candidatura da deputada  Maria do Rosário.

No Facebook, X (antigo Twitter), Tik-Tok e Instagram, virilizaram (como se diz) as fotos do Mourão, dizendo que aos 70 anos não tinha mais idade para ajudar às vítimas das cheias e do Olívio mexendo numa panela de feijão para a comida de alguns flagelados. A mensagem era óbvia: os gaúchos não souberam votar nas últimas eleições, elegendo Mourão senador em vez do Olívio e em outubro vão ter uma nova chance para se recuperar elegendo os candidatos do PT.

Transformados pela mídia e pelas redes sociais num grande evento humanitário e pelos políticos num jogo em busca do poder, as pessoas esquecem que, o que está por trás de tudo isso, é a profunda desigualdade social em que vivemos, na qual qualquer evento climático pune sempre os mais pobres.

Em vez de discussões técnicas sobre o que deveria ter sido feito para proteger Porto Alegre e outras cidades gaúchas, como insistem em fazer os políticos, o que deveria ser debatido é até quando vamos suportar viver numa sociedade que reserva os melhores locais nas cidades para os ricos e empurra os pobres para as periferias.

A continuar essa situação atual defendida no fundamental, pelos partidos da dita esquerda e da direita, os trágicos eventos que ainda vivemos no Sul vão se multiplicar pelo Brasil inteiro.

É preciso lutar por algo muito maior, a Revolução Brasileira.