A expressão maldita
Por Renato Dornelles

Se tem uma expressão que abomino é o tal "mimimi". E não são poucos os motivos. Primeiro, porque acho sonoramente horrível. Também por considerá-la tão pouco criativa, para não dizer, medíocre. E por fim, e mais importante, por vê-la sendo utilizada, na maioria dos casos, como uma suposta resposta a quem demonstra irresignação diante de preconceitos.
Muitas vezes, o tal "mimimi" vem acompanhado de ataques ao que muitos julgam depreciativamente "politicamente correto". Ou seja: ao que se opõe a ofensas e outras manifestações de exclusão e estigmatização de grupos sociais.
A vida toda, cansei de ouvir explicações do tipo "é só uma piada", minimizando o que, durante a infância, mexeu muito com minha autoestima. Sim, para uma criança negra, ouvir chacotas em relação a sua raça pode fazer com que ela assimile isso como o normal e realmente se sinta inferior.
Ainda mais quando a piada é carregada de um componente histórico, ligado ao período em que, em um dos maiores crimes da humanidade, os africanos e seus descendentes foram escravizados e tratados como seres sub-humanos. Mas nada é por acaso e tudo tem sua razão de ser.
Mas a cada vez que ouço essa expressão, lembro-me de uma história que me foi contada. Um homem adulto, não pertencente a qualquer grupo que sofra preconceito por questões de raça, gênero, orientação sexual, idade ou formação física costumava contar piadas preconceituosas. Se alguém reclamasse, ele alegava que era "mimimi" de parte do "reclamão".
Certa vez, esse homem se envolveu em uma briga e foi chamado de "guampa" pelo oponente (a expressão era outra, mais forte, mas vamos fazer de conta que era "guampa"). Ele irritou-se ainda mais, e o apelido pegou. A partir dali, a cada vez que alguém se referia a ele como "guampa", ele queria briga. Até que um dia alguém lhe indagou: "Ué? Mas não está sendo mimimi de tua parte?" Dizem que ele nunca mais utilizou a expressão maldida.
Moral da história: quando a ofensa, piada, apelido ou seja o que for, carregado de preconceito, não atinge a pessoa, é "mimimi" de quem reclama. Mas se atinge, aí a conversa é outra.